Por Sergio Teperman
Todos falam dos filmes catástrofe, mas não creio que já tenham imaginado artigos catástrofe. Mas por culpa do aquecimento global, do bug do milênio e da torcida do Corinthians, as tragédias causadas por fenômenos naturais vêm se acumulando.
E em última análise, a arquitetura, a engenharia e o planejamento urbano têm a sua responsabilidade nesses eventos. Claro que não são as únicas responsáveis: o despreparo das cidades, da população e dos órgãos de controle é muito maior. Enquanto terremotos são imprevisíveis, inundações e maremotos são perfeitamente pré-identificáveis.
Isso além dos vendavais, tempestades, tornados, furacões e furaquinhos. Naturalmente as nações mais pobres e subdesenvolvidas estão como sempre muito menos preparadas, tanto do pronto de vista da solidez (e da elasticidade) das construções, quanto da pronta reação a essas calamidades. Deixemos de lado as previsíveis, porque nesse caso, a falta de providências é pura irresponsabilidade. O que às vezes surpreende é que a força da natureza supera frequentemente toda a estrutura de planejamento, de construção e até mesmo a preparação de um país desenvolvido para as eventuais catástrofes do globo terrestre.
Sempre me pergunto como nos ricos Estados Unidos se veem fotos de furacões ou tornados onde há uma enorme destruição de casas e mesmo mansões, com paredes e até estrutura de madeira. Por que não usam concreto? Ou será que existe o princípio de que já que vai haver furacões e tornados é melhor construir leve, deixar cair e reconstruir que sai mais barato?
Essa falta de preparo e reação deu-se no recente terremoto de San Francisco e de forma mais evidente, trágica e desmoralizante no episódio Katrina e no tsunami pós-terremoto do Chile. O mesmo problema, em escala bastante menor, de ruptura de diques deu-se há um mês na França, com tristes resultados e repete o que sucedeu na Holanda em 1953, quando duas mil pessoas morreram afogadas. Com um comentário positivo: os holandeses se recuperaram ao longo dos anos criando um sistema extraordinário de proteção, o plano Delta, que se desenvolve durante 50 anos, governo após governo, com um planejamento territorial e urbano exemplar.
Um caso ainda mais impressionante de eficiência é o da ponte Akashi-Kyo, ao lado de Kobe, uma ponte pênsil sobre um estreito de águas revoltas, com pilares de 400 m de altura. O terremoto que destruiu Kobe (e até os previdentes japoneses não estavam preparados) simplesmente não abalou a ponte que estava em construção e só com parte do tabuleiro colocado, o que reduziria ainda mais a sua estabilidade.
Com esse exemplo fica provado que projetos sérios, responsáveis, em locais corretos e não em pirambeiras sem base de sustentação, podem resistir a grandes abalos naturais.
Disse naturais, porque as sólidas construções alemãs viraram pó durante a 2a Guerra Mundial com os eficientes bombardeios aéreos americanos e ingleses.
Qual seria a responsabilidade dos arquitetos e engenheiros em terremotos ou maremotos? Dizer que um bom planejamento urbano os evitaria é ilusão. Significaria por exemplo afastar todas as cidades do litoral do Pacífico e do Índico, ou tirar os países do círculo de fogo do Pacífico, da falha de San Andrés, dos Andes...
No Brasil, que "felizmente" só sofre com inundações e deslizamentos, significaria tirar toda a população dos morros.
E quem mora lá? A não ser alguns ricos com construções bem protegidas, só a população de baixa ou nenhuma renda aceita viver sobre uma base "líquida" apesar de ter sempre as melhores vistas. E se o planejamento urbano conseguisse o milagre de anular as diferenças sociais, quem iria fornecer o baseado e o pó de cada dia? Problema sério. Se os países mais estruturados não conseguem enfrentar as consequências de um terremoto (L'Aquila na Itália, Concepción no Chile), o que esperar do pobre Haiti se nem São Francisco de Assis resistiu?
E discordo que saques após terremotos ou inundações se deem unicamente devido à pobreza e à fome das populações. Será que alguém pretende comer uma TV de plasma ao vinagrete? Já estive em Santiago no 6o andar de um hotel quando houve o que eles chamaram de um levíssimo tremor (assusta!), justo quando de manhã cedo apertei a descarga do sanitário. Caramba, nunca imaginei que uma válvula de descarga pudesse ser tão poderosa!
Trabalhei inclusive em Caracas e fui surpreendido pelas normas de construção contra terremotos. Simplesmente não sabia (que ignorância!) que os Andes se estendem até a cidade de Mérida, onde há estações de esqui a 5.000 m de altitude e que a terra treme.
Aprendi então que para os cálculos de edifícios altos, os esforços são assimilados ao efeito do vento, e as construções melhores e mais modernas resistem a fortes abalos, mas a esmagadora maioria das construções do mundo, inclusive as vergonhosas construções escolares da igualitária China, matou milhares de crianças, pela precariedade criminosa de suas estruturas e alvenarias.
Enfim, dá para ver como são tênues as possibilidades de planejamento e arquitetura contra as forças da natureza, principalmente porque boa parte das catástrofes não são previsíveis.
De previsões de natureza e de construções só se sabe efetivamente um fato cabal: a lua, as marés, o concreto e as mulheres curam em 28 dias.
Fonte: Revista AU
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